A moda está conectada com aspectos históricos, culturais e sociais. Existem fatos curiosos que mostram como esse segmento está em constante evolução, como o inconfundível tingimento azul da Prússia, criado ao acaso no século 18. Na época, era extremamente valioso, e estampou uniformes oficiais e bandeiras do país. Para além de questões de identidade nacional, hoje a moda e a indústria têxtil não se limitam à dificuldade de extrair cores, mas se envolvem em problemáticas bem mais contemporâneas.
A indústria têxtil é forte no Brasil, sendo que estamos entre os maiores do mundo no setor de vestuário. Mas, ao mesmo tempo que impactamos a economia, impactamos o meio ambiente. Segundo a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção, geramos cerca de 175 mil toneladas de resíduos por ano, além de consumir e contaminar muita água no processo de fabricação.
Pensando em reduzir esse impacto, existem formas de amenizar esse cenário. Com o advento dos brechós, a ideia de compra sustentável se popularizou. Mas, ainda existem muitas questões a serem discutidas no setor têxtil no Brasil, e nada melhor que ouvir especialistas no assunto!
Conversamos com Adriana Yumi Sato Duarte , graduada em Têxtil e Moda (USP), mestra e Doutora em Engenharia Mecânica (Unicamp) e docente na graduação e pós-graduação em Design da Faculdade de Artes, Arquitetura, Comunicação e Design da Unesp. Ela atua também no ensino e pesquisa sobre sustentabilidade e desenvolvimento de novos produtos. Confira abaixo a entrevista!
O mercado da moda tem cada vez mais se preocupado com pautas como representatividade e inclusão. Quais caminhos a moda deve aderir para ser mais funcional, sem deixar de ser também um modo de expressar identidade?
É urgente que nós olhemos não somente para a criação, mas também para o processo de fabricação das roupas. A funcionalidade vem do conforto, da praticidade de uso e da manutenção de uma peça de roupa. A inclusão demanda que repensemos os materiais dos tecidos e, principalmente, da modelagem. Quando se pensa em inclusão,representatividade e funcionalidade de uma peça de roupa, na minha visão, um dos grandes desafios que ainda precisa ser olhado com mais cuidado é a tabela de medidas adotadas pelas marcas, principalmente por conta da diversidade dos corpos brasileiros.
É cada vez mais fácil ter acesso a peças que viram tendência nas mídias, principalmente pela rapidez da indústria e a facilidade de compras virtuais- sem falar do impacto do marketing e publicidade. Quais os impactos da produção em massa no mercado da moda?
A produção em massa, como o próprio nome diz, é uma produção industrial em larga escala. Esse tipo de produção faz com que muitas peças de roupa sejam fabricadas em pouco tempo e com menor custo para atingir um número elevado de consumidores. Com isso, surgem dois grandes problemas: sociais e ambientais. O menor custo de produção passa pela busca de mão-de-obra barata, que pode gerar sérios problemas de exploração de trabalhadores, por exemplo. Os problemas ambientais vão desde o uso de recursos naturais (água) e produtos químicos, até o descarte incorreto das peças de roupa. Hoje em dia, o que está mais na mira do mercado de moda é o pós-uso. Se a produção em massa fabrica muitas peças de roupa e, com as mudanças de tendências, essas peças são usadas por um curto período de tempo e logo substituídas por outras, para onde vai todo esse descarte? O que é jogar fora uma roupa? O que fazer com essa quantidade de roupas sem uso?
Como é possível popularizar a conscientização sobre consumo, moda e sustentabilidade num Brasil que, por exemplo, depende do uso da água para a produção de peças?
Toda produção industrial usa recursos naturais, e a moda não fica para trás. A conscientização está nos pequenos gestos, no entendimento básico que estamos vivendo mudanças climáticas que serão irreversíveis e trarão consequências graves para o nosso dia-a-dia e para um futuro próximo. Acredito que a informação é melhor do que a punição. Precisamos aproveitar as possibilidades de comunicação para atingir o maior número de consumidores possível. Os consumidores precisam entender que têm papel fundamental na sustentabilidade, seja para cobrar as empresas e poder público para adotar condutas adequadas, seja para tomar decisões no momento de compra, uso e descarte com consciência. Sustentabilidade precisa ser acessível e disponível.
Adriana Yumi Sato Duarte é Professora do Departamento de Design da Universidade Estadual Paulista. Saiba mais em: